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domingo, 11 de dezembro de 2011

Álcool

Álcool

Guilhotinas, pelouros e castelos
Resvalam longemente em procissão;
Volteiam-me crepúsculos amarelos,
Mordidos, doentios de roxidão.

Batem asas de auréola aos meus ouvidos,
Grifam-me sons de cor e de perfumes,
Ferem-me os olhos turbilhões de gumes,
Descem-me a alma, sangram-me os sentidos.

Respiro-me no ar que ao longe vem,
Da luz que me ilumina participo;
Quero reunir-me, e todo me dissipo ---
Luto, estrebucho... Em vão! Silvo pra além...

Corro em volta de mim sem me encontrar...
Tudo oscila e se abate como espuma...
Um disco de oiro surge a voltear...
Fecho os meus olhos com pavor da bruma...

Que droga foi a que me inoculei?
Ópio de inferno em vez de paraíso?...
Que sortilégio a mim próprio lancei?
Como é que em dor genial eu me eternizo?

Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,
Foi álcool mais raro e penetrante:
É só de mim que ando delirante ---
Manhã tão forte que me anoiteceu.

                       Mário de Sá-Carneiro

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

De tanto olhar o sol






De tanto olhar o sol

De tanto olhar o sol,
queimei os olhos,
De tanto amar a vida enlouqueci.
Agora sou no mundo esta negrura.
À procura
Da luz e do juízo que perdi.

Miguel torga

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Esperança




Esperança:
isto de sonhar bom para diante
eu fi-lo perfeitamente,
Para diante de tudo foi bom
bom de verdade
bem feito de sonho
podia segui-lo como realidade

Esperança:
isto de sonhar bom para diante
eu sei-o de cor.
Até reparo que tenho só esperança
nada mais do que esperança
pura esperança
esperança verdadeira
que engana
e promete
e só promete.
Esperança:
pobre mãe louca
que quer pôr o filho morto de pé?

Esperança
único que eu tenho
não me deixes sem nada
promete
engana
engano que seja
engana
não me deixes sozinho
esperança.

Almada Negreiros

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Perdigão perdeu a pena!


Perdigão perdeu a pena
Não há mal que lhe não venha.

Perdigão que o pensamento
Subiu a um alto lugar,
Perde a pena do voar,
Ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
Asas com que se sustenha:
Não há mal que lhe não venha.

Quis voar a uma alta torre,
Mas achou-se desasado;
E, vendo-se depenado,
De puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
Lança no fogo mais lenha:
Não há mal que lhe não venha.

Luís Vaz de Camões

sábado, 8 de outubro de 2011

Sempre a Razão vencida foi de Amor!



Sempre a Razão vencida foi de Amor;
Mas, porque assim o pedia o coração,
Quis Amor ser vencido da Razão.
Ora que caso pode haver maior!

Novo modo de morte e nova dor!
Estranheza de grande admiração,
Que perde suas forças a afeição,
Por que não perca a pena o seu rigor.

Pois nunca houve fraqueza no querer,
Mas antes muito mais se esforça assim
Um contrário com outro por vencer.

Mas a Razão, que a luta vence, enfim,
Não creio que é Razão; mas há-de ser
Inclinação que eu tenho contra mim.

Luís de Camões

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

A eternidade não existe!



Explicação da Eternidade


Devagar, o tempo transforma tudo em tempo.
o ódio transforma-se em tempo, o amor
transforma-se em tempo, a dor transforma-se
em tempo.

os assuntos que julgámos mais profundos,
mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis,
transformam-se devagar em tempo.

por si só, o tempo não é nada.
a idade de nada é nada.
a eternidade não existe.
no entanto, a eternidade existe.

os instantes dos teus olhos parados sobre mim eram eternos.
os instantes do teu sorriso eram eternos.
os instantes do teu corpo de luz eram eternos.

foste eterna até ao fim.

José Luís Peixoto, in "A Casa, A Escuridão"

terça-feira, 20 de setembro de 2011

São só professores e cães bêbados!


Fotografia @ Alandroal


Quando o tempo foge e no céu só pairam estrelas e pensamentos vazios, acendo um cigarro de chocolate como quem procura ar para respirar. O frio da noite ajuda-me a concentrar, caminho sem destino, caminho sozinho acompanhado por mil vozes, o meu pensamento é uma prisão, penso que não devia pensar, penso que devia pensar naquilo que evito pensar, penso porque pensei anteriormente sair para pensar, penso. Caminhos escuros estradas e vielas, procuro sob as estrelas a coragem de me ouvir. A minha atenção prende-se sempre aos barulhos mais estranhos, aos ruídos dos problemas dos outros e ao que deviam fazer. 
Na rua cruzo-me sempre com aqueles que não pensam, não pensam mas sentem, e seguem sempre o que sentem e por incrível que pareça são felizes, mesmo que de uma maneira muito sui generis. Quanto mais pensamos mais complicadas se tornam as coisas. Pensar é o grande erro humano por isso nestas horas brancas em que caminho sozinho penso no que costuma dizer o amigo Jota, "nesta rua são só professores e cães bêbados".

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Grito !


Fotografia @ Porto

Grito para não ser ouvido,
grito a quem não me quer ouvir, a quem não gosta de mim.
Grito.
Grito ao céu e ás imagens paradas,
grito ao futuro para ouvir o meu passado

Falo com quem quis ter, daquilo que queria ser
sussurro desejos de uma hora branca,aos minutos de cores vivas.

Emudeço perante o vazio do olhar de uma multidão
Embruteço perante a inércia da vontade de te querer ver.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Em tempos de crise, trancas à porta!


        Hoje passei o meu dia a bater a portas fechadas, portas velhas com cadeados ferrugentos, portas de uma sociedade podre e desorganizada. Eu que como outros 11 milhões de habitantes me debato todos os dias com as ambiguidades e incertezas deste país, decidi entregar-me ao sistema por uma noite.Não penso nem  quero pensar, cansado de procurar respostas junto de quem nada sabe, hoje já com os punhos em sangue, decidi dormir e esperar que o acido corroa os grilhões, amanhã será dia de mudar de estratégia, a,amanhã arrombarei todas as portas.


Fotografias @ Elvas

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Bad trip

Truque Tóxico

Volto ao quarto de pensão, fumo até ao vómito
isto é : drogo-me.....
....abro a caixa de papelão, aparentemente cheia de sonhos
escolho um, fumo mais erva, nenhum sonho me serve,
abro a caixa dos pesadelos.....
o silencio ocupa-me e da caixa libertam-se corpos
cores violentas, olhares cúbicos, pássaros filiformes
cadeiras agressivas
limo as arestas fibrosas dos objectos
arrumo-os pelo quarto, de preferencia nos cantos
dou-lhes novos nomes, novas funções, suspiro extenuado
embora a sonolenta tarefa não tenha sido demorada
....outra caixa, azulada, abro-a
entro nela e fecho-a, o escuro solidifica-se na boca
tenho medo durante a noite
alguém se lembrou de atirar fora a caixa......
....luzes, umbigos obscurecidos pelas etiquetas
dos pequenos produtos de consumo, tóxicos
FRAGIL - MANTER ESTE LADO PARA CIMA
NÃO INCLINAR
TIME TO BUY ANOTHER PACKET
O quarto está completamente mobilado de corpos
explodem caixas, o sangue alastra
estampa-se nas paredes sujas de calendários e cromos
de pin-ups obscenas
....fendas de bolor no espelho
o reflexo do corpo arde como uma decalcomania
TIME TO BUY ANOTHER PACKET
todos dormem dentro de caixas, uma serpente flutua
falamos baixinho
não se ouvem mais barulhos de cidade
o sono e o cansaço subiram-me á boca
....movemo-nos lentamente para fora de nossos corpos
e devastamos, devastamos..... 


Al Berto


Pic B.M. By me.

domingo, 4 de setembro de 2011

Espelho mágico, espelho meu!


Fotografia @ Tribeca jazzclub , Porto

"Life, like a mirror, never gives back more than we put into it”
unknown

terça-feira, 30 de agosto de 2011

É urgente...

É urgente mudar, abdicar, encontrar, amar, pensar, quebrar, rasgar, arriscar, trabalhar, lutar, sonhar,brincar, partir, construir, decidir, evoluir, emergir, desistir, sentir, sofrer, beber, ler, ver, querer, esconder, morrer, viver. Não necessariamente por esta ordem!